Onde canta o Sabiá; As aves, que aqui gorjeiam, Não gorjeiam como lá. Nosso céu tem mais estrelas, Nossas várzeas têm mais flores, Nossos bosques têm mais vida, Nossa vida mais amores. Em cismar, sozinho, à noite, Mais prazer eu encontro lá; Minha terra tem palmeiras, Onde canta o Sabiá. Minha terra tem primores, Que tais não encontro eu cá; Em cismar –sozinho, à noite– Mais prazer eu encontro lá; Minha terra tem palmeiras, Onde canta o Sabiá. Não permita Deus que eu morra, Sem que eu volte para lá; Sem que disfrute os primores Que não encontro por cá; Sem qu'inda aviste as palmeiras, Onde canta o Sabiá. |
Gonçalves Dias nasceu em 1823 na cidade de Caxias(MA), era filho de um português e uma mestiça e orgulhava-se de trazer no sangue a mistura das raças formadoras do Brasil. Em Coimbra, estudou direito e devido a isso suas primeiras publicações sofreram uma forte influência da literatura medievalesca portuguêsa, com acentuada tendência clássica. Quando escreveu o poema em 1843, se encontrava em Coimbra realizando seus estudos universitários, ou seja, em exílio voluntário e não político.
A primeira fase do romantismo brasileiro buscou se desligar dos modelos clássicos que sempre se prenderam aos modelos greco-latinos. O poema busca uma métrica popular (redondilhas maiores: versos de sete sílabas poéticas), uma forte musicalidade que tem a ver com o jeito de falar brasileiro e com certos recursos, como o ritmo e a rima. A simplicidade na linguagem, o saudosismo, o subjetivismo, o sentimentalismo e a idealização da natureza, são outras características desta canção de amor à pátria onde evidencia-se o nacionalismo próprio dos românticos.
O poema se articula em torno da oposição entre dois espaços; a pátria (Brasil) e o exílio (Portugal). Tal antítese é evidenciada pelas palavras lá e cá, oxítonas marcantes que também ressaltam a nacionalidade. Portugal se torna um lugar de exílio marcado pela carência e o Brasil, a pátria amada, o país exuberante e paradisíaco.
O poeta ainda faz uso de elementos naturais brasileiros como a palmeira e o sabiá, enfatizando o nacionalismo. Sabiá, com letra maiúscula, confere um significado simbólico ao pássaro, criando uma sonoridade muito brasileira, jamais vista, ao aparecer quatro vezes no poema e ao rimar com os monossilábicos cá e lá.
"É uma poesia cujo encanto verbal desaparece quando traduzida para outra língua. Desaparece mesmo quando dita com a pronúncia portuguesa", diz o poeta moderno brasileiro Manuel Bandeira se referindo à Canção do exílio.
Vários outros escritores também registraram a sensação do exílio parodiando a canção de Gonçalves Dias ou mantendo com ela relações de intertextualidade. Dentre eles: Casimiro de Abreu, Oswald de Andrade, Murilo Mendes, Carlos Drummond de Andrade, Vinicius de Moraes, Jõao Paulo Paes, dentre outros. Em 1909, Osório Duque Estrada venceu um concurso instituído para a escolha da letra do Hino Nacional onde manteve uma relação de intertextualidade com a segunda estrofe do poema.
Enfim, o primeiro canto brasileiro verdadeiramente autêntico, o melhor exemplo em poesia do projeto romântico de construçaõ de uma realidade nacional.
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